A história de Marina começa em uma tarde chuvosa de terça-feira.

Servidora pública há mais de 12 anos, enfermeira dedicada da rede estadual de saúde de Minas Gerais, ela acabava de voltar do trabalho quando encontrou, em cima da mesa da cozinha, uma carta oficial.

Ao abrir, os olhos correram pelas palavras frias e burocráticas. Um silêncio pesado tomou conta de sua casa.

— “Revisão do valor da ajuda de custo, conforme Decreto nº 48.113/2020…”

Marina sentiu o chão desaparecer. 

Era como se o Governo estivesse dizendo que os anos de dedicação, plantões noturnos, feriados sacrificados e os dias que ela deixou os filhos doentes com a vizinha… não valiam mais nada.

O que ela recebia como compensação pelo seu deslocamento, pela troca forçada de município, pela vida que teve que reconstruir, agora seria cortado.

Não por decisão judicial. 

Não por erro dela. 

Mas por um decreto. 

Um decreto seco, frio e administrativo.

Um corte que não considerava sua história, nem seu esforço, nem sua dignidade.

Marina não estava sozinha. 

Outros servidores, como por exemplo, professores, policiais, técnicos, assistentes, começaram a relatar o mesmo problema de Marina. 

Sem explicação adequada, sem direito ao contraditório.

Era como se o sistema dissesse: “Nós ditamos as regras, você obedece, você aceita, e portanto, você perde.”

Mas Marina não aceitou essa realidade.

Ela procurou orientação jurídica. 

Estudou, entendeu que o Decreto 48.113/2020, embora publicado com aparência de legalidade, escondia brechas, feria princípios constitucionais, violava direitos adquiridos dos servidores públicos de Minas Gerais e se chocava com decisões já pacificadas pelo Judiciário.

E ela decidiu que iria lutar até o fim para mudar a sua realidade de vida.

Esta é a história de milhares de servidores que estão sendo prejudicados sem saber que têm direito à reparação salarial por conta da ajuda de custo.

E talvez, essa também seja a sua história.

Neste artigo, você vai entender como esse decreto afetou a vida de tantos servidores públicos, por que ele pode ser considerado ilegal e, principalmente, como você pode se proteger e reivindicar o que é seu por direito.

O que diz o Decreto 48.113/2020 sobre Ajuda de Custo?

O Decreto 48.113/2020, promulgado pelo Governo de Minas Gerais, introduziu alterações significativas nas regras para concessão da Ajuda de Custo aos servidores públicos estaduais. 

Essas mudanças têm gerado controvérsias, especialmente no que tange à sua legalidade e conformidade com a legislação vigente.​

O Decreto 48.113/2020 visa regulamentar a concessão da Ajuda de Custo para despesas com alimentação, conforme previsto no artigo 189 da Lei nº 22.257/2016. 

Este artigo estabelece que a ajuda será concedida ao servidor cuja jornada de trabalho seja IGUAL ou SUPERIOR a seis horas diárias.​

Contudo, o decreto introduziu uma nova exigência: além das seis horas diárias, o servidor deve cumprir uma carga horária mínima de 30 HORAS SEMANAIS para ter direito ao benefício. 

Essa adição não está prevista na lei original e tem sido objeto de críticas por parte de especialistas jurídicos.

A principal crítica ao Decreto 48.133/2020 reside no fato de que ele altera os critérios estabelecidos por uma lei estadual, o que, segundo o princípio da legalidade, não é permitido. 

Decretos são instrumentos do Poder Executivo destinados a regulamentar leis, não a modificá-las. 

Portanto, ao impor uma nova condição para a concessão da Ajuda de Custo, o Decreto 48.113/2020 estaria extrapolando sua função regulamentar.

Além disso, o decreto exclui determinadas categorias de servidores, como policiais civis, militares e bombeiros, do direito ao benefício. 

Essa exclusão não encontra respaldo na legislação vigente e tem sido considerada discriminatória, ferindo o princípio da isonomia.​

Diante dessas controvérsias, diversos servidores têm recorrido ao Poder Judiciário para contestar as disposições do decreto. 

Em várias decisões, os tribunais têm reconhecido a ilegalidade das novas exigências impostas e determinado a concessão da Ajuda de Custo conforme os critérios originais estabelecidos pela Lei nº 22.257/2016.

Por que o Decreto 48.113/2020 é ilegal?

A ilegalidade do Decreto 48.113/2020 começa por um ponto central do Direito Administrativo: o princípio da legalidade. 

Esse princípio determina que a administração pública só pode fazer o que está expressamente autorizado em lei. 

Portanto, nenhum decreto pode inovar na ordem jurídica, criando ou restringindo direitos que não estejam previstos na legislação original. 

E foi exatamente isso que o governo de Minas Gerais fez ao editar o Decreto 48.113/2020.

A norma estabeleceu um novo critério que não consta na Lei Estadual nº 22.257/2016: a exigência de que o servidor tenha uma jornada semanal mínima de 30 horas para ter direito à Ajuda de Custo. 

Porém, a lei estadual fala apenas em jornada diária mínima de seis horas, sem fazer qualquer exigência de carga semanal.

Ou seja: o Governador de Minas Romeu Zema extrapolou seu poder regulamentar, modificando indevidamente os critérios legais já definidos pela Assembleia Legislativa

Esse acréscimo de exigência é inconstitucional, pois viola a reserva legal e o devido processo legislativo.

Além disso, o decreto também restringe o alcance da Ajuda de Custo a determinados grupos de servidores, excluindo policiais civis, militares, bombeiros e servidores da saúde em regime especial, sem nenhuma justificativa legal para isso. 

Tal discriminação, além de arbitrária, viola o princípio da isonomia, previsto no artigo 5º da Constituição Federal.

O próprio Tribunal de Justiça de Minas Gerais já se posicionou a favor dos servidores em decisões recentes, reconhecendo que nenhum decreto pode alterar o conteúdo de uma lei. 

Quando isso acontece, o caminho mais seguro para o servidor é buscar a ajuda de um advogado especialista em servidores públicos e restabelecer seu direito com base na lei original, e não no decreto.

Em resumo, o Decreto 48.113/2020 é ilegal porque:

  • Cria uma exigência que não existe na lei (30h semanais);
  • Modifica indevidamente a interpretação do artigo 189 da Lei nº 22.257/2016;
  • Fere o princípio da legalidade e da reserva legal;
  • Viola o princípio da isonomia ao excluir categorias específicas de servidores;
  • Vai além do papel de um decreto, que deveria apenas regulamentar e não legislar.

Princípio da Legalidade e Hierarquia das Normas

No Direito, o princípio da legalidade é uma das pedras fundamentais da atuação do Estado. 

Ele está previsto expressamente no artigo 37 da Constituição Federal e estabelece que a Administração Pública só pode fazer aquilo que a lei autoriza. 

Ou seja, diferente das questões particulares, que podem fazer tudo aquilo que a lei não proíbe, o agente público só age se houver respaldo legal.

Esse princípio garante que nenhum funcionário público, gestor ou autoridade possa agir por vontade própria, sem previsão expressa em norma válida. 

Ele é a principal barreira contra abusos, arbitrariedades e distorções dentro da estrutura do Estado.

Mas para entender por que esse princípio é tão importante, precisamos também falar sobre a hierarquia das normas no ordenamento jurídico.

Já a hierarquia normativa é uma espécie de “escada de autoridade” entre as leis. 

No topo, temos a Constituição Federal, que é a lei  suprema do país. 

Abaixo dela, vêm as leis complementares, leis ordinárias, leis estaduais, e, mais abaixo, os regulamentos e decretos, que são normas infralegais, ou seja, normas que existem apenas para especificar e aplicar o que já está previsto em uma lei superior.

E sobre isso quero te dar um alerta: nenhum decreto pode contrariar ou alterar uma lei, e muito menos criar restrições onde a própria lei foi clara ao garantir direitos

Quando isso acontece, a norma inferior se torna ilegal e inconstitucional.

Exemplo prático:

Imagine que uma lei estadual garanta a um servidor público o direito a receber um benefício chamado Ajuda de Custo, desde que ele cumpra uma jornada diária mínima de seis horas.

Agora imagine que o governador edite um decreto exigindo que, além das seis horas diárias, o servidor TAMBÉM cumpra 30 horas semanais para ter acesso a esse mesmo direito.

Pergunta: esse decreto pode impor uma exigência nova, que não está prevista na lei?

A resposta é não!

Porque esse decreto está modificando o conteúdo da lei, o que ele não pode fazer. 

Ele ultrapassou os limites do poder regulamentar e violou o princípio da legalidade.

Outro exemplo: suponha que uma lei estadual garanta um direito a todos os servidores efetivos. 

Um decreto é criado e exclui categorias específicas, como policiais civis ou servidores da saúde, sem que a lei tenha feito essa distinção. 

De novo: isso fere a isonomia e contraria o texto legal.

Esses são exemplos claros de como a quebra da legalidade e da hierarquia das normas pode gerar prejuízos diretos ao servidor, muitas vezes silenciosamente, sob o pretexto de “organizar” ou “modernizar” a administração.

E o mais grave: essas distorções, quando não questionadas, se perpetuam, e pode fazer com que você perca muito dinheiro no final das contas.

E isso eu tenho certeza de que você não quer, não é mesmo?

Inconstitucionalidade do decreto nº. 48.113/2020

O Decreto nº 48.113/2020, editado pelo governador Romeu Zema, é mais do que um simples desrespeito à legalidade administrativa. 

Ele representa uma afronta direta à Constituição Federal, sendo, portanto, inconstitucional sob diversos aspectos.

Mas afinal, o que torna um decreto inconstitucional?

Quando um ato do Poder Executivo contraria os princípios, direitos ou normas da Constituição, ele viola o ordenamento jurídico de forma grave, exigindo que o Judiciário atue para anular os seus efeitos. 

No caso do Decreto 48.113/2020, a inconstitucionalidade se dá principalmente por dois motivos: desvio de finalidade e violação de direitos adquiridos.

Desvio de finalidade do poder regulamentar

A Constituição autoriza o chefe do Executivo a editar decretos apenas para regulamentar leis, ou seja, para explicar como elas serão aplicadas na prática, nunca para criar novas regras ou restringir direitos já garantidos.

No entanto, o Decreto nº 48.113/2020 vai além da simples regulamentação da ajuda de custo prevista no Estatuto dos Servidores Públicos do Estado de Minas Gerais

Ele impõe novas exigências, cria requisitos não previstos na lei e exclui servidores de forma arbitrária, como no caso daqueles que cumprem carga horária reduzida por razões legais ou médicas.

Ou seja: o decreto cria obstáculos ilegais ao direito à ajuda de custo, extrapolando totalmente o poder regulamentar do governador.

Violação de direitos adquiridos

Outro ponto de inconstitucionalidade está na supressão de direitos já consolidados. 

Muitos servidores públicos mineiros vinham recebendo regularmente a ajuda de custo, com base nos critérios previstos em lei. 

A partir da vigência do decreto, passaram a ter o benefício cortado de forma abrupta, sem qualquer mudança na legislação que embasava o pagamento.

Isso caracteriza violação ao direito adquirido, que é expressamente protegido pelo artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal

A norma constitucional é clara ao dizer que “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”.

Ou seja: nem mesmo uma nova lei poderia anular esse direito retroativamente, muito menos um simples decreto.

Violação à isonomia

O Decreto 48.113/2020 também é inconstitucional porque quebra o princípio da isonomia, ao tratar de forma desigual servidores que estão em situações semelhantes. 

Por exemplo, ele exclui do direito à ajuda de custo os profissionais que, por força de lei ou decisão judicial, trabalham em jornada especial, como por exemplo, muitos servidores da saúde e da segurança pública.

Esses servidores, apesar de cumprirem a jornada legalmente definida, são penalizados injustamente pelo decreto, em clara afronta ao artigo 5º, caput, da Constituição Federal, que assegura que “todos são iguais perante a lei”.

Quais foram os efeitos do Decreto de Romeu Zema para os servidores?

O Decreto nº 48.113/2020, assinado por Romeu Zema, não foi apenas um ato administrativo inofensivo.

Seus efeitos foram profundamente sentidos por milhares de servidores públicos mineiros, especialmente aqueles que atuam nas áreas mais essenciais do Estado, como saúde, segurança pública e educação.

Esse decreto, na prática, restringiu drasticamente o acesso à ajuda de custo, um direito garantido por lei a servidores que, por causa do seu trabalho, precisam atuar fora de sua lotação original ou sede habitual.

Servidores que até então recebiam regularmente a ajuda de custo passaram a ser surpreendidos com o corte do benefício, mesmo sem alteração legislativa. 

A norma simplesmente criou critérios não previstos em lei para negar ou cancelar o pagamento, ignorando completamente os princípios da legalidade e da proteção ao direito adquirido.

Muitos profissionais da saúde, por exemplo, atuam sob carga horária especial de 24 horas semanais, com base em decisões judiciais, acordos coletivos ou dispositivos legais. 

Com o decreto, esses servidores passaram a ser tratados como se estivessem em situação irregular, perdendo o direito à ajuda de custo simplesmente por cumprirem a carga horária legalmente estabelecida.

Isso gerou insegurança jurídica e sensação de injustiça, com forte impacto sobre a motivação e o bem-estar da categoria.

Ao cortar a ajuda de custo, o governo mineiro, na prática, reduziu a remuneração líquida de servidores que já enfrentam dificuldades financeiras. 

Muitos desses profissionais foram deslocados de cidade ou região e contavam com o valor da ajuda de custo para custear alimentação, transporte, hospedagem e outros gastos relacionados ao novo local de trabalho.

Com a retirada abrupta do benefício, vários servidores passaram a arcar com essas despesas do próprio bolso, o que prejudica não apenas suas finanças, mas também sua qualidade de vida e desempenho funcional.

O decreto também gerou um forte sentimento de desvalorização do servidor público, principalmente porque a medida foi adotada sem diálogo com os sindicatos, sem consulta às categorias afetadas e sem justificativa clara sobre sua real necessidade.

Isso reforçou a percepção de que o governo estaria tratando os servidores como obstáculos orçamentários, e não como profissionais essenciais ao funcionamento do Estado.

Como consequência natural da injustiça imposta, muitos servidores recorreram à Justiça para garantir o restabelecimento do benefício. 

O número de ações individuais e coletivas aumentou, com decisões judiciais reconhecendo a ilegalidade do decreto e determinando o pagamento retroativo da ajuda de custo.

O Poder Judiciário, inclusive, já tem sinalizado que o decreto ultrapassa os limites da regulamentação, violando direitos adquiridos e criando regras que só poderiam ser instituídas por lei, e não por simples ato do governador.

Como reverter a situação e garantir seus direitos?

Para os servidores públicos mineiros prejudicados pelo Decreto nº 48.113/2020, há caminhos legais seguros para reverter essa injustiça e recuperar o que foi retirado de forma indevida. 

Seja por meio de recurso administrativo, seja pela ação judicial, é possível buscar a proteção de direitos violados e, em muitos casos, até obter o pagamento retroativo da ajuda de custo negada ilegalmente.

Recurso Administrativo

Se o servidor teve sua ajuda de custo suspensa, negada ou cortada após a entrada em vigor do Decreto 48.113/2020, o ideal é protocolar um recurso administrativo solicitando a reanálise do caso com base na ilegalidade da norma.

Etapas para protocolar o seu recurso administrativo:

  • Reúna os documentos: portaria de lotação, comprovantes de deslocamento, contracheques anteriores (com e sem o benefício), e qualquer ato que tenha determinado a transferência de cidade ou local de trabalho;
  • Escreva o pedido de reconsideração: argumentando que a negativa fere a legislação vigente e que o decreto extrapolou o poder regulamentar. É importante destacar que a ajuda de custo está prevista em normas superiores, e que o decreto, por sua natureza administrativa, não pode restringir um direito legalmente garantido;
  • Protocole no setor responsável do órgão: cada autarquia ou fundação (como FHEMIG, HEMOMINAS, FUNED, SES ou ESP-MG) tem um canal específico para esse tipo de requerimento. É possível que o pedido seja feito presencialmente ou por meio eletrônico;
  • Acompanhe o processo: caso a resposta seja negativa ou demore excessivamente, o servidor já pode partir para o segundo caminho: a judicialização do caso.

Ação Judicial

Diante da ilegalidade já reconhecida por diversos juristas e decisões judiciais isoladas, a ação judicial é o caminho mais firme e eficiente para garantir o direito à ajuda de custo, especialmente quando o recurso administrativo não resolve.

O que pode ser solicitado na Justiça?

  • Reconhecimento da ilegalidade do Decreto 48.113/2020 no seu caso concreto;
  • Restabelecimento imediato da ajuda de custo;
  • Pagamento dos valores retroativos com correção monetária e juros;
  • Declaração da nulidade de eventual ato administrativo que tenha suspendido o pagamento indevidamente.

O Judiciário já tem reconhecido que o decreto extrapola os limites legais, interferindo diretamente em normas que só poderiam ser modificadas por lei. 

Ou seja: não se trata de discutir mérito, e sim de afronta direta ao princípio da legalidade e da hierarquia das normas.

Além disso, a Justiça tem sido sensível à situação dos servidores que foram prejudicados injustamente, sobretudo em contextos onde há desvio de função, carga horária regular e deslocamento obrigatório.

O que é necessário para entrar com a ação?

  • Documentos pessoais;
  • Documentos funcionais (lotação, movimentação, carga horária, contracheques);
  • Provas do corte ou da negativa da ajuda de custo;
  • Eventual indeferimento do recurso administrativo (caso já tenha tentado essa via).

Com essas informações, um advogado especialista em servidores públicos poderá propor a ação com fundamentação sólida, pedidos claros e boa perspectiva de êxito.

Conclusão

Se você ainda tem dúvidas sobre esse assunto e gostaria de conversar com um advogado que realmente entende dessa área, fale conosco agora mesmo pelo Whatsapp. Será um prazer te atender! 😉